4 de junho de 2018, 15h17
Por Ronaldo Rayes e Bruno Henrique Coutinho de Aguiar
O governo federal buscava, desde meados de 2017, restringir os benefícios da desoneração da folha de salários das empresas, a exemplo da Medida Provisória 774, que acabou sendo frustrada e tendo seus efeitos revogados pela Medida Provisória 794, além de contar com um sem-número de ações no Poder Judiciário que lhe suspendiam os efeitos.
Mas a recente greve dos caminhoneiros que assolou o país abriu uma janela de oportunidade para o governo no Congresso Nacional, que, a pretexto de atender as exigências dos grevistas e em contrapartida às subvenções governamentais para redução do preço do óleo diesel, atingiu seu desiderato ao promulgar a Lei Federal 13.670, publicada no Diário Oficial da União em 30 de maio, na véspera do feriado de Corpus Christi.
Essa lei reduz drasticamente o rol de empresas e receitas elegíveis à opção pela desoneração da folha de salários, que permitia a substituição da apuração e recolhimento da contribuição previdenciária patronal de 20% pela apuração e recolhimento da contribuição previdenciária substitutiva sobre a receita bruta (CPRB) a alíquotas que variavam de 1% a 4,5%, a depender do tipo de atividade empresarial.
Observadas as condições previstas originariamente na Lei Federal 12.546, de 2011, permanecerão no atual regime de desoneração de folha até 31 de dezembro de 2020 os setores de tecnologia da informação e comunicação, empresas jornalísticas e de radiodifusão, transporte rodoviário, ferroviário e metroviário coletivo de passageiros, transporte rodoviário de cargas, construção civil e obras de infraestrutura, produção de carnes, vestuário, calçados e automóveis, entre outros. Mantida a atual legislação, o regime de desoneração de folha será extinto definitivamente em 2021.
Por outro lado, setores como transporte ferroviário de cargas (em detrimento do transporte rodoviário de cargas), transporte aéreo e marítimo, manutenção e reparação de aeronaves e embarcações, setor hoteleiro, indústria de alimentos, bebidas, produtos químicos, medicamentos, comércio varejista de determinadas categorias, entre outros, foram automaticamente excluídos do regime de desoneração de folha de salários.
A lei recentemente publicada expressa que as restrições aplicadas à desoneração da folha (artigos 1º e 2º) só serão aplicadas a partir de 1º de setembro de 2018, respeitada a anterioridade nonagesimal para aumento da carga tributária prevista na Constituição Federal para as contribuições sociais em geral, apesar de revogar expressamente com efeito imediato os dispositivos da Lei 12.546/11 que mantinham os setores acima arrolados na desoneração. A interpretação mais adequada privilegia a manutenção integral do cenário normativo revogado pelo período da noventena constitucional, ou seja, até 31 de agosto de 2018.
Não obstante, aqueles setores que fizeram a opção irrevogável e irretratável pelo regime da desoneração de folha em janeiro de 2018 deverão avaliar a oportunidade e conveniência de ajuizar ações no Poder Judiciário buscando manter suas opções pela desoneração até dezembro de 2018, afastando qualquer ato coator tendente a exclui-los da desoneração de folha em setembro deste ano, a exemplo do que foi visto em meados de 2017, quando a Medida Provisória 774 pretendeu excluir setores da desoneração a partir de julho daquele ano, e o Poder Judiciário vetou tal pretensão, expedindo inúmeras decisões favoráveis aos contribuintes para mantê-los no regime diferenciado, ao menos, até dezembro daquele ano.
Por fim, um pequeno alento para os contribuintes, uma vez que o artigo 3º da Lei Federal 13.670/18 expressamente reconheceu a inaplicabilidade da Medida Provisória 774 no período de julho a agosto de 2017, autorizando a restituição de valores indevidamente recolhidos a maior e remitindo e anistiando débitos eventualmente constituídos pela Receita Federal contra alguns contribuintes pela suposta inobservância daquela medida provisória. Assim, há total segurança jurídica para pôr fim a inúmeras ações judiciais sobre o tema e ressarcir os contribuintes em relação a infundadas exigências fiscais.
Em suma, mais uma vez, os empresários são impelidos pelo Estado brasileiro a saldar a conta de sua incapacidade de gerir uma política econômica e fiscal eficiente e alinhada com os modernos padrões de governança dos Estados liberais, apequenando-se ao clientelismo e interesses menores de alguns segmentos da sociedade.
Ronaldo Rayes é sócio do Rayes & Fagundes Advogados Associados.
Bruno Henrique Coutinho de Aguiar é sócio do Rayes & Fagundes Advogados Associados.
Revista Consultor Jurídico, 4 de junho de 2018, 15h17 - Site Conjur
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