Efeitos da contribuição sindical fixada em norma coletiva
Opinião
Publicado em 23/02/2018

23 de fevereiro de 2018, 8h10

 

 

Por Paulo Sergio João

 

 

A Lei 13.467/17, ao dar à contribuição sindical caráter facultativo (artigo 545), rompeu, de um lado, com a tradição histórica de sindicato custeado de forma compulsória por trabalhadores e empregadores, cujos efeitos do passado são discutíveis sobre os resultados dessa representação formal e, de outro lado, a nova disposição revisitou o direito à liberdade sindical do artigo 8º da Constituição Federal.

 

O que se constata no modelo anterior é que a fragilização da representação sindical trouxe desqualificação do negociado e a atuação frequente da Justiça do Trabalho para atuar no mérito das negociações e, em alguns momentos até, reconhecendo a eficácia da negociação coletiva com função da representatividade sindical e da autonomia da vontade coletiva (emblemático a OJ Transitória 73 sobre PLR mensal negociado entre metalúrgicos de São Bernardo do Campo com a Volkswagen).

 

Nestes momentos que antecedem para trabalhadores a data da antiga contribuição sindical, os sindicatos profissionais têm anunciado a fixação de contribuições por meio de assembleia, por ocasião da data base, ou romarias a empresas para recolher dos trabalhadores a autorização de desconto a ser encaminhada pela entidade aos empregadores. E nesse aspecto é que pareceria duvidosa a obrigação transmitida aos empregadores de uma ou de outra forma para o desconto em folha.

 

Em matéria de negociação coletiva, as cláusulas são variadas e os sindicatos repetem mais do mesmo, concedendo prazo para oposição de trabalhadores em formulário do sindicato e em horário comercial. O nome da contribuição pode ser variado, sendo frequentemente utilizada a expressão “contribuição para fortalecimento sindical laboral”, e é imposta aos empregados não sindicalizados, excluindo o associado. Trata-se de previsão que já foi resolvida pela jurisprudência e o STF já consolidou na Súmula Vinculante 40 a restrição de decisões de assembleias que decidem a imposição de contribuição de não associados à entidade sindical.

 

Ainda nesse caso, a previsão de prazo para os trabalhadores de exercer o direito de oposição, a partir da publicação da convenção, é inconsistente porque, na vigência da norma, outros empregados serão admitidos e não poderão exercer o direito de recusa porque já ultrapassado o prazo inicial. E, ainda, transfere ao empregador uma obrigação que viola o disposto no artigo 5º, X, da Constituição Federal quanto à inviolabilidade da intimidade e a vida privada. Ora, se o ato de manifestação de adesão ao sindicato é livre, não poderia ser controlado pelo empregador a fim de efetuar os descontos previstos em norma coletiva e que têm como fundamento a opção de uma manifestação política. É um assunto interna corporis que deve ser tratado de acordo com a Convenção Internacional 98 da OIT.

 

Outra situação, noticiada na edição do último domingo (18/2) do jornal O Estado de S. Paulo, é a da peregrinação de dirigentes sindicais em empresas para, por meio de listas, permitir ao sindicato o encaminhamento de autorizações coletivas aos empregadores. Essa situação nos coloca diante da validade jurídica na imposição porque viola regra fundamental do exercício da liberdade sindical.

 

De fato, o exercício da liberdade sindical pressupõe manifestação livre diante de um modelo plúrimo porque a simples adesão ou não ao sindicato gerado na unicidade atende apenas parcialmente o direito à liberdade sindical.

 

Todavia, a análise crítica também pode ser encaminhada ao sindicato patronal quanto insere no bojo da norma coletiva a obrigação às empresas do setor econômico de recolher o que se denomina “contribuição para o fortalecimento sindical patronal”. É assunto que diz respeito ao sindicato e seus representados e não deveria integrar a norma coletiva que regulamenta os contratos de trabalho dos trabalhadores pelo período definido na convenção ou acordo coletivo.

 

Parece, salvo melhor juízo, que tais cláusulas de contribuição aos sindicatos (profissionais e patronais) estão alocadas impropriamente em convenções coletivas, e o caráter obrigacional não é entre as partes, e sim das partes em relação aos seus representados, e somente nesta relação é que poderiam admitir eficácia jurídica.

 

Finalmente, o artigo 545 da CLT, com sua nova redação, traz a obrigação para os empregadores de desconto em folha de pagamento “dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato”. Ainda que previsto em norma coletiva, independentemente de sua inadequação jurídica, as empresas deveriam aguardar a manifestação expressa e individual dos trabalhadores ou, pelo menos, a ratificação individual de consentimento previsto no documento que o sindicato venha a encaminhar.

 

Portanto, o ato de manifestação autorizando o desconto deveria ser de modo a respeitar sua natureza pessoal, homenageando o livre exercício do direito à liberdade sindical entre trabalhadores ou empresas relativamente aos respectivos sindicatos.

 

 

 

 

Paulo Sergio João é advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Fundação Getulio Vargas.

 

 

 

Revista Consultor Jurídico, 23 de fevereiro de 2018, 8h10 - Site Conjur - A imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet

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