André Richter - Repórter da Agência Brasil - 19/10/2017 - 18h30 - Atualizado 19/10/2017 - 18h59 - Brasilia-DF/Site EBC - Foto de capa do site Multisom retirada da internet
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin votou hoje (19) pela inconstitucionalidade de normas do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que proíbem homens homossexuais de doarem sangue por 12 meses após a última relação sexual. Após a manifestação de Fachin, que é relator da ação, a sessão foi suspensa, e o julgamento deverá ser retomado na próxima quarta-feira (25). Faltam os votos de dez ministros.
O julgamento foi motivado por uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR), protocolada em junho do ano passado. A ação questiona a validade das normas do Ministério da Saúde e da Anvisa que “dispõem sobre a inaptidão temporária para indivíduos do sexo masculino que tiveram relações sexuais com outros indivíduos do mesmo sexo realizarem doação sanguínea nos 12 meses subsequentes a tal prática".
Segundo a procuradoria, as resoluções e portarias que criaram regras para doação de sangue por homossexuais são discriminatórias.
Em seu voto, o relator entendeu que as normas não podem excluir homossexuais de exercerem sua cidadania ao doarem sangue. Segundo Fachin, a exclusão preventiva de qualquer grupo de pessoas é inconstitucional. Além disso, o controle de qualidade do sangue deve ser feito por exames adequados, e não com base na orientação sexual, segundo o ministro.
"O estabelecimento de grupos e não conduta de risco incorre em discriminação, pois lança mão a uma interpretação consequencialista desmedida, apenas em razão da orientação sexual”, afirmou o ministro.
Na próxima semana, devem votar os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e a presidente da Corte, Cármen Lúcia.
Durante o julgamento, várias entidades se manifestaram, todas contra as regras. Pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família, a advogada Patrícia Gorisch disse que a proibição parte do princípio de que os homossexuais são promíscuos e os transforma em “pessoas de segunda categoria”.
"Essas pessoas vão aos bancos de sangue ajudar o próximo, efetivar seu direito de cidadania e saem da lá com um não, pelo simples fato de serem quem são. Isso é totalmente contrário com os tratados internacionais de direitos humanos”, disse.
No entendimento do defensor Gustavo da Silva, representante da Defensoria Pública da União (DPU), a norma trouxe de volta o antigo termo de grupo de risco e vincula doenças sexuais somente aos homossexuais. Para o defensor, atualmente a questão é tratada como comportamento de risco, válido também para homens heterossexuais.
“O grande desafio nas lutas antidiscriminatórias é buscar as sutilezas subjacentes aos discursos aparentemente inofensivos”, afirmou.
Durante o julgamento de hoje, não houve manifestação oral da Anvisa ou do Ministério da Saúde. Em informações enviadas ao STF no ano passado para subsidiar o voto do de Fachin, a Anvisa declarou que segue informações científicas internacionais para estabelecer as normas e que as regras para doação de sangue atendem aos princípios da precaução e proteção à saúde.
Na ocasião, o órgão declarou que homens homossexuais não são proibidos de doar sangue, desde que atendam aos requisitos de triagem clínica.
Texto alterado às 18h59 para acréscimo de detalhamento da ação no segundo parágrafo